A primavera dinamarquesa segue, lá fora. Pela janela, vejo as nuvens azuladas das falsas miosótis criando o pano de fundo para os lírios que pontilham gramados e canteiros com um vibrante e despudorado amarelo.
Mas o outono no Brasil e as notícias sombrias que vêm de lá têm desviado minha atenção do que acontece ao meu redor.
Acompanhar o que acontece no Brasil aqui de longe tem me feito viver de susto em susto. Recebo opiniões e informes fragmentados que me causam sobressaltos, me tiram o fôlego e envenenam meu ânimo.
Antes, esses sobressaltos eram espaçados e, causados por notícias nas quais eu não queria acreditar, leves e inconsequentes. O mal-estar que causavam passavam ao me distanciar da internet. As notícias traziam relatos sobre tramoias para tirar do poder alguém que acabara de ser democraticamente eleito e me pareciam o resultado de mentes levemente paranoicas.
Mas os sobressaltos foram se tornando mais frequentes e profundos com as notícias cada vez mais preocupantes sobre o controle do Legislativo por um homem cujo sorriso me causa engulhos. Depois de acompanhar a trajetória desse homem por alguns meses, cada vez que o vejo sorrir, tenho a convicção de que alguém está sendo lesado.
Nesses dias, amaldiçoo a internet. É através dela que vejo o precipício em que meu país parece estar caindo. Notícias do bom humor, criatividade e bravura nas ruas me reanimam para, em seguida, o cinismo de sorrisos impunes em manchetes de jornais me abaterem a esperança.
Queria não saber de nada, desligar todos os aparelhos e ir lá fora, curtir a primavera, me alegrar com a beleza sem recato. Mas, aqui dentro, não consigo deixar de acompanhar, aos sobressaltos, o outono brasileiro.
Margareth Marmori 