Para que os refugiados continuem bem-vindos

Cartaz de boas-vindas aos refugiados na manifestação no dia 12 de setembro de 2005 em Copenhague.
Cartaz de boas-vindas aos refugiados na manifestação no dia 12 de setembro de 2005 em Copenhague.

Neste fim de semana fui à demonstração no centro de Copenhague que reuniu mais de 30 mil pessoas para dar boas-vindas aos refugiados. Antes de sair, me perguntei se realmente fazia sentido participar daquela manifestação e se o nome dela, “Refugees Welcome” (Bem-vindos refugiados), não seria um engodo.

Nesses dias, o drama dos refugiados, principalmente os vindos da Síria, ocupa as mentes e os corações dos dinamarqueses. Pelas redes sociais, grupos de voluntários se mobilizam para tentar ajudar os migrantes através de doações, dinheiro e organização de eventos. As doações de roupas, sapatos e outros objetos como brinquedos foram tantas que a Cruz Vermelha chegou a pedir que, pelo menos por enquanto, as pessoas parem de dar coisas para os centros de refugiados. O que a organização precisa agora é de gente para ajudar a colocar ordem nas pilhas de doações e preparar as instalações para receber os refugiados.

Mas uma ativista que discursou na manifestação de ontem disse algo que eu também teria dito, se pudesse me dirigir aos demonstrantes. Ela pediu que o entusiasmo e calor humano que os dinamarqueses demonstram agora em relação aos refugiados não desapareça como uma “døgnflu” (moscas que vivem apenas um dia). Compartilho a preocupação dela. Tento ser otimista mas duvido que, passada a comoção causada pela trágica fotografia de um menininho morto numa praia europeia, os dinamarqueses continuem tão interessados em dar boas-vindas aos refugiados.

Pelo que vejo no meu dia a dia aqui, os dinamarqueses têm uma preocupação sincera em promover o bem-estar físico das pessoas, sejam elas imigrantes ou não. Eles, por exemplo, contribuem maciçamente para campanhas que levantam fundos para organizações humanitárias com atividades no país e no exterior. Mas ter as necessidades básicas atendidas, embora possa ser motivo para gratidão, não é suficiente para que alguém se sinta bem-vindo.

Se eu pudesse, teria tentado saber dos dinamarqueses que encontrei na manifestação quantas vezes nos últimos anos eles pararam para perguntar “como vai” a um imigrante; e, se o fizeram, se pararam para ouvir com atenção a resposta. Também perguntaria a eles quantos amigos imigrantes, refugiados ou não, eles têm. Ou quantas vezes eles tomaram a iniciativa de puxar conversa com um imigrante e ter paciência para tentar entender a própria língua ser falada com um forte sotaque estrangeiro.

Manifestação para dar as boas-vindas aos refugiados em Copenhague - 12/09/2015 / Demonstration welcomes refugees in Copenhagen.
Manifestação no dia 12 de setembro de 2015 em Copenhague.

Anos atrás, corretores de todo país ouvidos pelo canal de televisão DR revelaram que os dinamarqueses se irritavam quando estrangeiros se interessavam em comprar um imóvel perto de onde moravam poque não os queriam como vizinhos. Duvido que esse tipo de atitude tenha mudado. Uma pesquisa da Cruz Vermelha divulgada em fevereiro deste ano mostrou que 70% dos dinamarqueses não têm quase nenhum ou nenhum contato com imigrantes e refugiados. Segundo a pesquisa, a quantidade de dinamarqueses que convivia de forma mais próxima com refugiados caiu de 1 em cada três em 2001 para apenas 1 em cada cinco em 2015.

Observo exemplos desse distanciamento em eventos sociais que, por um ou outro motivo, reúnem estrangeiros e dinamarqueses. Os dinamarqueses sentam-se sempre juntos, conversam animadamente e põem as fofocas em dia, enquanto os imigrantes costumam ficam isolados, alguns claramente sentindo-se como peixes fora d’água. Nessas reuniões, o que me anima é ver as crianças mais jovens, apesar da divisão entre os pais, se misturarem. As amizades entre elas costumam ignorar etnia, idioma, credo religioso e local de nascimento. Seria bom se os adultos se mirassem no exemplo delas para que os refugiados e os estrangeiros de modo geral continuassem se sentindo bem-vindos na Dinamarca.

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2 comentários Adicione o seu

  1. Regina Albrectsen disse:

    Artigo bastante relevante esse seu, cara Margareth Marmori. Ethos! Parabéns.

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    1. Obrigada, Regina. Fico muito feliz por sua leitura. Abraços.

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